domingo, 8 de junio de 2008

RÍO


Da mais alta janela da minha casa
Com un lenço branco digo adeus
Aos meus versos que partem para humanidade

E nao estou alegre nem triste.
Esse é o destino dos versos.
Escrevi-os e devo mostrá-los a todos
Porque nao posso fazer o contrário
Como a flor nao pode esconder a cor,
Nem o rio esconder que corre,
Nem a árvore esconder que dá fruto.

Ei-los que vao já longe como que na diligência
E eu sem querer sinto pena
Como uma dor no corpo.

Quem sabe quem os lerá?
Quem sabe a quem maos irao?

Flor, colheu-me o meu destino para os olhos.
Árvore, arrancaram-me os frutos para as bocas.

Rio, o destino da minha água era nao ficar en mim.
Submeto-me e sinto-me quase alegre,
Quase alegre com que se cansa de estar triste.

Ide, ide de mim!
Passa a árvore e fica dispersa pela Natureza.
Murcha a flor e o seu pó dura sempre.
Corre o rio e entra no mar e a sua água é sempre a que foi sua.

Passo e fico, como a Universo.

Fernando Pessoa Poemas de Alberto Caeiro

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